Ao relatar as seis constituições do Brasil, historiador vê na justiça o grande desafio nacional
Gabriel Manzano, de O Estado de S.Paulo
O mensalão que se arrasta na Justiça há anos, a Lei da Ficha Limpa que vai sendo adiada, a batalha do Conselho Nacional de Justiça pelo controle de tribunais e juízes. Esse retrato do Brasil não é só uma questão de justiça: é uma longa luta que se trava entre Estado e cidadania. "E nessa luta o Estado arbitrário prevaleceu e a cidadania perdeu de goleada", resume o historiador Marco Antonio Villa. "Como poderia ser diferente", pergunta ele, "se o próprio STF não dá exemplos de atitudes republicanas?"
A cidadania desprotegida, seja em tempos de mensalão ou, bem lá atrás, na escravidão, é o eixo central das 160 páginas de A História das Constituições Brasileiras - 200 Anos de Luta contra o Arbítrio, o livro que Villa acaba de lançar, com seis capítulos - um para cada carta - e um sétimo contendo um detalhado não-elogio ao Supremo, "porque o Judiciário é de lojnge o pior dos três Poderes".
É um relato direto, sem juridiquês e até divertido, tantos os absurdos que Villa garimpou em sua pesquisa. Para citar apenas dois: a primeira carta, de 1824, ignorou por completo a escravidão, com a qual conviveu por sete décadas. E a de 1967, no auge do regime militar, decidiu que "toda pessoa física e jurídica é responsável pela segurança nacional" - um simples truque para prender qualquer cidadão, sob qualquer pretexto, por falta gravíssima.
A goleada a que o autor se refere nasce de uma receita bem brasileira: "Leis voltadas não para o Brasil real, mas para um país imaginário. ou garantias que dependem de regulamentações jamais feitas."
O que há de comum entre as seis constituições que o sr. Estudou?
Em quase todas se percebe uma luta, que vem desde a independência, do cidadão contra o Estado arbitrário. Nessa luta, na maioria das vezes, o Estado ganhou de goleada.
De que forma?
Um truque típico é escrever uma lei no papel e imaginar que o problema está resolvido. Da primeira à última carta, determinou-se a autonomia dos poderes mas quem sempre mandou, como manda hoje, foi o Executivo. Organizavam-se eleições e elas eram fraudadas. Mulheres não votavam, não havia direito de greve. Surgem leis que dependem de regulamentação e esta nunca é feita. A atual, de 1988, um avanço em relação às outras, criou o mandado de injunção. Ele permite ao cidadão ir ao Supremo e exigir o atendimento de um direito se ele não está regulamentado.
O Estadão
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