quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Doações de R$ 70 mil e contratos milionários

Duas empresas que repassaram dinheiro para a campanha do deputado Fernando Bezerra Filho fecharam negócios de R$ 98 milhões com a Codevasf. A estatal é vinculada ao Ministério da Integração Nacional, comandado por Fernando Bezerra, pai do parlamentar

Vinicius Sassine
Guilherme Amado

Duas das principais empresas doadoras de campanha do deputado federal Fernando Coelho Filho (PSB-PE) assinaram 14 contratos com a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), no valor de R$ 98,6 milhões. Depois de doar R$ 50 mil ao então candidato em 2010, por meio de uma transferência eletrônica registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Flamac Incorporação e Construção ganhou um contrato de R$ 28,9 milhões com a Codevasf, assinado em julho de 2011. No mesmo ano, três aditivos prorrogaram os prazos de um contrato de R$ 12,2 milhões, vigente desde 2009. Doadora de R$ 20 mil em espécie a Fernando Filho, conforme registro no TSE, a construtora Granville & Bazan tem contratos com a Codevasf que somam R$ 57,4 milhões, assinados entre 2005 e 2011. No ano passado, sete aditivos contratuais prorrogaram prazos, adequaram serviços e ampliaram os valores contratados.

O deputado financiado pelas construtoras é filho de Fernando Bezerra Coelho Filho, ministro da Integração Nacional, e sobrinho de Clementino de Souza Coelho, que exerceu a presidência da Codevasf até segunda-feira. Um novo presidente para a estatal, vinculada ao ministério, só foi nomeado ontem pelo Palácio do Planalto. Tanto o pai quanto o tio do deputado passaram a comandar respectivamente o Ministério da Integração Nacional e a Codevasf a partir de janeiro de 2011.

Desde então, vêm favorecendo a base eleitoral da família, a região de Petrolina (PE), como o Correio mostrou em série de reportagens nos últimos dias. Parte dos contratos e aditivos com a Flamac e a Granville & Bazan foi assinada por Clementino, inclusive depois da reeleição de Fernando Filho para a Câmara. Antes de se tornar presidente interino, Clementino já exercia o cargo de diretor de Desenvolvimento Integrado e Infraestrutura da Codevasf desde 2003.

O valor dos contratos com as duas construtoras é 10 vezes maior do que o capital dos empreendimentos. Certidão da Flamac emitida pela Junta Comercial de Pernambuco mostra que a empresa tem um capital de R$ 5 milhões, distribuído entre quatro sócios. A construtora está sediada em Recife. Já o capital da Granville & Bazan, sediada em Petrolina e com escritório na vizinha Juazeiro (BA), é de R$ 4 milhões, também rateado entre quatro sócios. Os dois contratos com a Flamac, de R$ 41,1 milhões, se referem à execução de obras de esgoto sanitário, nas cidades de Tabira (PE), na Bacia do Rio São Francisco, e Araripina (PE). A Granville foi contratada pela Codevasf por R$ 57,4 milhões para operar e manter os sistemas de irrigação de diferentes perímetros irrigados em Pernambuco e Bahia.

Inquérito civil
Um dos projetos de irrigação, o Salitre, em Juazeiro, passou a ser investigado pelo Ministério Público Federal de Petrolina. O procurador da República Fábio Conrado Loula instaurou um inquérito civil público e pediu à Junta Comercial de Pernambuco que forneça os dados sobre a sociedade e possíveis alterações do quadro societário da Granville. “Solicitei a constituição da empresa para dar procedimento à investigação”, diz o procurador.

Por meio da modalidade convite, a Codevasf contratou a Granville para construir uma adutora, recuperar e manter os canais no perímetro Salitre. O custo foi de R$ 2,1 milhões. A investigação do MPF começou depois de uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), concluída em 2009. O TCU encontrou superfaturamento na execução dos serviços, obras executadas com licenças vencidas e licitações realizadas de forma indevida.

Nas eleições de 2010, a Granville só fez doações às campanhas de Fernando Filho e mais três candidatos, entre eles um primo do ministro Fernando Bezerra. A Flamac fez doação apenas para o filho do ministro. Outra empresa doadora, a Galvão Engenharia, fechou um contrato de R$ 77,9 milhões com o Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs), subordinado ao Ministério da Integração Nacional, para construir a Barragem Figueiredo no Ceará.

Diretor técnico da Flamac, Edgar Revoredo disse ao Correio que a empresa não foi beneficiada pela Codevasf. “Trabalhamos e apresentamos a melhor proposta, dentro de um processo licitatório.” Edgar não soube dizer a razão da doação à campanha de Fernando Filho, mas afirmou se tratar de um “processo legal”. Sobre as obras de esgoto, o diretor afirmou que elas dependem de licenças locais e que aditivos “são usuais”. Ele disse não conhecer o ministro Fernando Bezerra. “Sei que ele é de Petrolina.”

O Correio tentou ouvir os responsáveis pela Granville, mas não houve retorno das ligações. O deputado Fernando Filho, procurado por telefone e pela assessoria de imprensa, também não se pronunciou até o fechamento desta edição. A assessoria do Ministério da Integração Nacional repassou as perguntas para a Codevasf. A estatal informou que não tem registro de nenhum impedimento legal para a contratação das empresas. “Ambas atendem as exigências editalícias e legais”, informa.

Troca efetivada no Diário Oficial
O Diário Oficial da União publicou ontem a nomeação de Guilherme Almeida Gonçalves de Oliveira para a presidência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). O ato é assinado pela presidente Dilma Rousseff e pelo ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho. Guilherme substitui o irmão do ministro, Clementino de Souza Coelho, que continua diretor de Desenvolvimento Integrado e Infraestrutura da estatal. Guilherme era diretor interino da Área de Revitalização de Bacias Hidrográficas da Codevasf. A escolha dele para a presidência indica uma retomada de força do PT no Ministério da Integração Nacional. Ele é ligado aos petistas e substitui um nome do PSB, com vínculo familiar com o ministro.
Fonte: Correio Brasiliense/Política

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