sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Em clima tenso, STF rejeita dividir processo do mensalão

Lewandowski surpreende ao defender incompetência da Corte de julgar o caso e discute com relator

 

Mariângela Gallucci e Felipe Recondo - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O julgamento do mensalão começou tenso a quinta-feira, 2, no Supremo Tribunal Federal. Na primeira sessão que decidirá o futuro de 38 pessoas acusadas de integrar um esquema de compra de votos no Congresso durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, ministros discutiram entre si, explicitaram diferenças sobre o caso e atrasaram o cronograma inicial.
Lewandowski foi um dos que votaram em favor do desmembramento - Andre Dusek/AE
Andre Dusek/AE
Lewandowski foi um dos que votaram em favor do desmembramento
Com isso, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que fará a acusação, precisou ter sua exposição oral adiada para hoje. Os advogados de defesa vão falar apenas na semana que vem. A estimativa é de que o julgamento dure cerca de dois meses.
Logo após a abertura dos trabalhos, o advogado Marcio Thomaz Bastos, responsável pela defesa de um ex-diretor do Banco Rural, questionou a competência do Supremo para cuidar do caso. Isso porque, entre os 38 réus apenas 3 têm foro privilegiado, ou seja, por serem deputados federais, têm de ser julgados no tribunal - João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP). O restante dos réus teria de ser julgado em instâncias inferiores da Justiça, argumentou o advogado, ao pedir o desmembramento do caso.
A deliberação sobre essa questão colocou o relator do mensalão, Joaquim Barbosa, em rota de colisão com o revisor do processo, Ricardo Lewandowski. Houve, inclusive, bate-boca. Barbosa, que tende a votar pela condenação dos acusados, defendeu a competência do Supremo para julgar o caso. Mas Lewandowski discordou, mostrando que tende a divergir do colega em pontos do relatório. Como se tratava de uma questão que havia sido discutida anteriormente pelos ministros, Barbosa chegou a acusar o colega de "deslealdade". "Está em jogo a credibilidade do tribunal. Essa questão (desmembramento) já foi debatida três vezes. Esta é a quarta", disse Barbosa, que há seis anos propôs o desmembramento, mas foi voto vencido.
Lewandowski reagiu dizendo que o termo utilizado pelo colega era muito forte e isso prenunciava um julgamento "muito tumultuado". Ele também afirmou que estava sendo atacado pessoalmente. "Como revisor, ao longo deste julgamento farei valer o meu direito de me manifestar."
O presidente do STF, Carlos Ayres Britto, teve de interferir várias vezes para tentar apaziguar os ânimos e chegou a pedir ao revisor que fosse mais rápido em sua manifestação. O pedido não surtiu efeito. Ressentido com a pressão que sofreu para que liberasse o processo do mensalão, Lewandowski falou mais de uma hora sobre uma questão preliminar, tornando inviável o cumprimento do cronograma original.
Ele argumentou que em outras ocasiões o STF determinou a transferência de inquéritos e ações penais para a primeira instância, corroborando a tese de Thomaz Bastos segundo a qual um cidadão tem direito ao chamado duplo grau de jurisdição, isto é, de poder recorrer a uma instância superior da Justiça - isso está estabelecido, lembrou o advogado, na Constituição e no Pacto de San José da Costa Rica.
Terminada a discussão, a proposta de Thomaz Bastos foi rejeitada pelos ministros por 9 votos a 2 - além de Lewandowski, Marco Aurélio Mello votou pelo desmembramento. Depois, houve tempo apenas para que Barbosa lesse o resumo de seu relatório. Os trabalhos serão retomados hoje às 14 horas.
Consequência. Advogados de réus acreditam que, com o atraso, diminuem as chances de o ministro Cezar Peluso dar suas sentenças sobre o mensalão. Visto como um juiz duro, de forte formação no Direito Penal e que tenderia a votar pela condenação na maioria dos casos, ele vai se aposentar de forma compulsória no dia 3 de setembro por completar 70 anos.
Pelo cronograma definido pelo tribunal, Peluso conseguiria votar se antecipasse o seu voto. Ele só pode fazer isso, porém, após os votos do relator e do revisor do processo. Se o cronograma atrasar em um dia apenas, o ministro pode ficar de fora.
O calendário do julgamento já está "implodido", segundo observaram informalmente advogados de defesa. Alguns deles chegaram a especular a possibilidade de o STF ter sessões pela manhã a fim de manter o cronograma. Isso não impedirá novos atrasos por causa da tensão em plenário, avaliam os advogados dos acusados.
"Infelizmente ele (Peluso) não participará", disse Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende o publicitário Duda Mendonça. Ele ressaltou que o próprio voto antecipado já seria ruim porque no STF os ministros podem alterar o seu voto em meio ao debate em plenário.
Outro advogado, que pediu para não ser identificado, destacou as discussões entre Barbosa e Lewandowksi. "Em 30 minutos o relator e o revisor já estavam discutindo. O cronograma é inviável. O Peluso está fora", sentenciou.
COLABOROU EDUARDO BRESCIANI 
Fonte: Estadão.com.br

 

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